Sobre tudo


Encontraram-se em Paris. Não, foi em Nova Iorque. Talvez Amsterdã? Mais provável que tenha sido em Florianópolis mesmo, num lugar bem comum. Um shopping. Nada disso: uma típica padaria. O mês do encontro poderia ser junho ou julho. Fiquemos, pois, com agosto. Um dia de sol, mas chovia bastante. Garoava apenas. Ele de terno; ela de vestido. Ele de bermuda e manga curta; ela com uma roupa tão curta que o autor fica indeciso entre um short ou uma minissaia. Encararam-se, enfim.

– Muito quente para esta época do ano, não acha?; ela abriu a conversação.

– Acho; ele disse engolindo rápido o pão de queijo e quase se engasgando. – E tenho até uma teoria do sobretudo.

– Uma teoria sobre tudo?

– Não, não. Uma teoria do so-bre-tu-do; falou destacando as sílabas para mostrar que era apenas uma palavra. – Aquele casaco comprido, sabe? O sobretudo é algo que praticamente não vemos mais por aí. Antigamente, todo mundo andava com um. Hoje em dia, conheço dezenas de pessoas que sequer compraram um sobretudo nos últimos dez ou quinze anos. E, mesmo quem os usa atualmente, prefere sempre um modelo mais estiloso, tão fininho que esquentar é um elemento quase dispensável.

– E o que mais sua teoria aponta?; ela questionou, atenta aos gestos que ele fazia com as mãos, quase desenhando a teoria no ar.

– Não sei bem certo. Mas pode apontar uma mudança na moda, como foi com o fim do uso dos chapéus nas grandes cidades, por exemplo. Se bem que pode indicar também o fim da civilização como a conhecemos. Ainda preciso de mais tempo para preencher as lacunas; ele disse como se vislumbrasse a quantidade de trabalho que teria pela frente.

– Se for o fim da civilização, espero que sua teoria ainda demore bastante para ser comprovada.

– Não será neste inverno, isso eu posso garantir.

Riram. Trocaram despedidas e combinaram um novo bate papo para a semana seguinte.

Desta vez, ela estava de calça jeans. O vento sul viera com tudo e pegara ambos desprevenidos. Na frente da padaria, ele levantou seu paletó para protegê-la dos papéis e da sujeira que voavam pela rua. Entraram e foram se sentar na mesma mesa em que conversaram da outra vez, mas estava ocupada por um sujeito que lia um livro tão antigo quanto sua aparência. Era um sujeito fora de sua época, como se tivesse existido entre os séculos quinze e dezenove. Não dava para distinguir.

– Pena que a mesa estava ocupa…; ele começou a falar quando foi interrompido por ela.

– Você viu o livro que aquele homem estava lendo? O título era “Teoria sobre tudo”. Acho que você deveria falar com ele…

Mas o sujeito já tinha ido embora.

Pediram um café e foi só então que ela contou que trabalhava como meteorologista. Depois, casaram-se. E estão planejando uma viagem para Nova Iorque. Ou Paris. Talvez Amsterdã?…

> Crônica publicada no Jornal Notícias do Dia em 13/08/2015.

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