Alguma pretensão só faz sentido aos artistas quando acompanhada de significados e não justificativas. E significados são as principais fontes de sustentação em Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas (2003), de Tim Burton.
Apesar da falsa impressão que Alice no País das Maravilhas (2010) tenha provocado – pelo menos visualmente –, é com Peixe Grande que o criador chega ao seu Ponto-de-Não-Retorno. Eis seu suspiro criativo final, trazendo elementos presentes em seus trabalhos anteriores que vão além de algumas boas intenções. Temos, então, as opções políticas de O Planeta dos Macacos (2001); o humor suburbano de Os Fantasmas se Divertem (1988) e Marte Ataca! (1996); a descoberta da paixão de Edward Mãos de Tesoura (1990); a sobriedade dramática de Batman (1989) e Batman – O Retorno (1992); a realidade exagerada de Ed Wood (1994); e o tom histórico-fabular de A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça (1999).
Ainda assim, com tantas referências dentro de sua própria identidade autoral, Burton não se deixa levar pela paródia fácil, como ocorre na refilmagem de A Fantástica Fábrica de Chocolate (2005), ou mesmo pela superficialidade cenográfica de Alice no País das Maravilhas, já sugerida de forma definitiva no próprio texto de Lewis Carrol. Há, porém, um interregno ligeiramente fora do circuito de Burton que é O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet (2007) – filme pouco referencial, que busca sentidos estranhos ao gênero musical.
A última questão que Tim Burton parece instigar com Peixe Grande tem a ver com a possibilidade de contar grandes histórias sem a necessidade de se expor para além da sua própria arte. Sob certo aspecto, após este filme, o artista parece ter sentido demasiadamente a responsabilidade da criação, quando seu melhor cinema está intrínseco à liberdade da diversão. Por este viés, saliente-se, apontamos a diversão como característica indissociável da arte, muito diferente do que se convencionou chamar de entretenimento. Logo, o contador de histórias (interpretado ora por Ewan McGregor ora por Albert Finney) escolhe o mundo das ideias e não dos sonhos, sendo este último típico de Terry Gilliam em As Aventuras do Barão de Münchausen (1988) ou em O Mundo Imaginário do Doutor Parnassus (2009).
Antes de escolher quais significados realmente interessam, Peixe Grande trata daquele juízo individual, feito uma história contada de pai para filho, decodificada de maneiras diferentes ao longo do tempo, mas sempre sólida quando se está disposto a aceitar o impossível.