Anos atrás, quando fazia uma cadeira de prática curricular (dar aula) na faculdade, desenvolvi com mais dois colegas um trabalho sobre a televisão, atuando ao lado de alunos 6ª. Série do Ensino Fundamental. Mais do que um atrativo para os garotos, a parte prática, ao lidar com imagens de desenhos animados, a produção experimental de um desenho e o contato com as ferramentas eletrônicas, estabeleceu a condição sine qua non na interação com o grupo de alunos. O artifício dos desenhos animados lhes forneceu um assunto próximo, permitindo a discussão sobre o tema “identidade”.
Como afirmava o educador Paulo Freire, a leitura do mundo precede a leitura da palavra. Da mesma forma, ao discutirmos sobre as representações humanas presentes nos desenhos animados também possibilitamos que a atenção dos garotos fique mais aguçada quando estiverem realizando outras experiências cotidianas e sociais.
No sentido de desmistificar a ideia de mídia, principalmente a televisiva com seu caráter que inibe a interação, colocando o telespectador como agente passivo, estruturamos nosso trabalho nas bases da práxis. Aos alunos coube a elaboração de um desenho animado (Dragon Ball Z, no caso), participando de todas as etapas dessa tarefa. Como Dragon Ball Z é uma animação que traz consigo a figura do herói, também procuramos desnudar o herói de suas principais características. Assim, estabelecemos as semelhanças e diferenças existentes entre uma história heroica e uma história do nosso cotidiano.
Para chegar até este ponto, os garotos foram municiados com o aprendizado de ferramentas eletrônicas, como o uso do computador e de uma câmera de vídeo. Quando da realização do desenho animado, os alunos experimentaram a criatividade de um realizador audiovisual. Com base no formato de roteiro televisivo, eles escreveram enredo e diálogos, utilizando para isso suas próprias palavras. Eis, pois que a teoria se realizou pela prática, afinal, é possível atuar de forma que a reflexão funcione no mesmo momento da ação.
O desenho animado é um elemento importante na formação de uma criança, que os assiste seja na televisão ou em outros aparelhos eletrônicos, como telefones móveis, tablets e afins.
A questão que se apresenta ainda hoje não é sobre a validade destas ferramentas de lazer (televisão, cinema, quadrinhos, internet…), mas a melhor forma de assimilar e, principalmente, questionar o seu conteúdo.
Todo ensino consiste numa única intenção: fazer pensar. Essa é a lição de casa que nunca chega ao fim.
> Crônica publicada no Jornal Notícias do Dia em 26/09/2013.